sábado, 6 de março de 2010

FIC...Kiss Yesterday Goodbye CAP 8

Capítulo VIII


— Você está levando cobertores? — Prih perguntou a Alison, sem saber que o carro estava carregado de agasalhos e mantas de lã.
— Fique tranqüila, Prih. Não vamos morrer de frio lá. A ca­bana não é tão primitiva como você está pensando — respondeu Alison, passando-lhe Molly para os braços.
— Além disso, quem disse que deixarei Alison sair da cama? — brincou AJ, piscando para a mulher. — Vamos nos aquecer um ao outro. . . — E deu a partida no carro, com Alison tapando-lhe a boca com a mão para impedir que ele dissesse alguma bobagem.
Prih, dando risada, acenou despedindo-se. Depois entrou com Molly.
Brian estava tomando café na cozinha. Prih parou à porta com a criança nos braços, aspirando aquele aroma doméstico.
"Como Alison deve ser feliz!", pensou.
Colocou a garota na cadeira e procurou pela sopinha de cereais, que Alison já deixara preparada. E, sem deixar de falar com Molly, preparava seu almoço.
Era a primeira vez que Prih dava de comer a uma criança; achou a experiência gratificante. Molly fazia gracinhas, espirrava comida em seu rosto, ria. Prih se divertia, e falava o tempo todo com a garota.
Não havia notado que estava fazendo tanto barulho, até que Brian, que tentava ler o jornal do dia, reclamou:
— Como alguém pode ler um jornal por aqui? E, além dessa barulheira toda, não há nenhuma notícia interessante! — E se le­vantou de mau humor.
Prih deu mais uma colherada de comida para Molly.
— Gostaria de saber o que há de errado com ele. . . — falou baixinho para a garota.
Molly balançou a cabeça, séria, e resmungou algumas sílabas, como se estivesse dando a resposta.
— Sem dúvida, você tem razão. É isso mesmo! — Prih riu, apertando-lhe as mãozinhas.
Tirou a menina do cadeirão e lhe lavou o rosto e as mãos. Daí a pouco precisou trocar-lhe as fraldas. Prih estava maravilhada com Molly, mas observou que aqueles cuidados todos acabavam consu­mindo muito tempo. Como Alison conseguia cuidar da filha, da casa e ainda fazer tantas outras coisas?
Brian estava encostado à janela, olhando a neve que caía inter­mitente. Prih colocou a menina para brincar perto da lareira e foi para o lado dele.
— Brian, desculpe-me pela algazarra. Eu não tinha me tocado. . .
— Está tudo bem, Priscila. É que não estou acostumado com crianças. — Ele se voltou, com um sorriso apagado.
— Esta é uma boa oportunidade de ir se acostumando — ela brincou. — Dentro de alguns anos, provavelmente já teremos as nossas...
— Pelo amor de Deus, Priscila! Não vamos passar o carro na frente dos bois. Vamos esperar o casamento, depois pensamos nisso...
— Mas você quer filhos, não quer Brian?
 — Sim, talvez eu queira um filho. Mas não tão rápido!
 Prih tentou argumentar, mas ele a impediu, cruzando o dedo indicador sobre seus lábios.
— Vamos devagar, Priscila! Falta ainda quase um ano para o nosso casamento. Para que se preocupar desde já com o número de filhos que vamos ter?
— É que eu não quero esperar muito para ter filhos, Brian. Quero poder acompanhar o crescimento deles, e não ficar olhando de longe, sem conseguir compreender o mundo em que eles estarão vivendo.
— Acontece, Prih, que durante um bom tempo você vai estar muito ocupada para pensar em crianças. Você terá muita coisa para fazer, pode estar certa disso.
— Que tipo de coisa? Caridade, levantamento de fundos para assistência social? Como Rosemary? Oh, Brian, não conte comigo para isso. . . Não faz o meu gênero!
— Calma Priscila! Suas atividades serão de outro tipo, garanto. Aliás, que tal começar já? Você poderia, por exemplo, me servir um uísque.
— Está bem. Mas vou ver primeiro se tem algum no armário de bebidas. . . Afinal, não estamos na nossa casa. . .
Passando por Molly, Prih teve uma surpresa. A garota estava de pé, sem se segurar em nada, e brincava com um de seus cavalinhos. Maravilhada, ela voltou correndo até o canto da sala onde Brian estava.
— Venha ver, Brian! Molly está de pé. . . Alison me disse que ela ainda não conseguia ficar sozinha. . .
— E você não ia providenciar o meu drinque? — Ele não deu a menor importância ao comentário. — Ou preciso ir eu mesmo?
Molly então perdeu o equilíbrio e caiu sentada. Até mesmo ela parecia surpresa com a façanha. Mas voltou aos brinquedos sem tentar repeti-la.
Prih, enquanto vasculhava o armário de bebidas, pensava em Brian, tentando compreendê-lo. Por que ele não vibrava com a garo­ta? Seria porque ela não era filha dele? Se assim fosse, ele certa­mente aplaudiria cada proeza que a menina fizesse.
Um pouco depois do almoço, enquanto Molly dormiu e Brian cochilava na poltrona, Prih resolveu ocupar-se com o preparo do jantar. E refletia sobre a rotina de dona-de-casa. Sempre a mesma coisa. . . E ocupar-se de atividades de assistência social, como Rose­mary, será que a satisfaria? Não, não via muito sentido nisso. . . Na verdade, queria continuar trabalhando na sua profissão.
Lá pelo fim da tarde Brian levantou-se. Após alguns minutos de conversa, Prih lhe sugeriu que fosse para casa. Ele estava tão entediado que aceitou prontamente a sugestão.
Prih também se sentia muito cansada. Agora ela entendia por que Alison estava precisando tanto de descanso. Como podia um bebê de oito meses dar tanto trabalho?
Tomou um banho quente, escovou os cabelos e vestiu a camisola que tinha ganho naquele Natal. Queria ficar bem à vontade. Afinal, estava sozinha e nenhuma visita era esperada. . .
Com um livro numa das mãos e um copo de chocolate quente na outra, Prih sentou-se numa poltrona o mais confortável possível, e colocou uma banqueta sob os pés. Mal acabara de ler o primeiro capítulo, a campainha tocou.
Levantou-se, passou a corrente de proteção na porta e a abriu alguns centímetros.
— Deixe de bobagem — ela ouviu Nick dizer. — Se fosse algum mau-caráter, não teria tocado a campainha. — Mas ela parecia não confiar na explicação. — Trago um recado do seu bem-amado. Não quer saber o que é?
Prih abriu a porta e ele entrou. Tirou o casaco, jogou-o sobre uma cadeira e foi para perto do fogo...
— Qual é o recado? — perguntou, enquanto vestia um robe.
— Não precisa se cobrir tão depressa, Moreninha. Já vi o que você tem para mostrar. — Ele hesitou um momento. — Quanto ao recado de Brian, é o seguinte: ele manda dizer que está se sentindo mal. E que não vem para lhe fazer companhia porque você está muito ocupada com Molly e ele iria atrapalhar.
— Está mal mesmo? Ou é mais uma de suas brincadeiras, Nick?
— Juro que é verdade, maninha.
— É. Ele não parecia mesmo muito bem quando foi para casa.
— É só um pouco de febre. Não se preocupe. Ele é que tem mania de dramatizar as coisas.
— Bem, você poderia ter me avisado pelo telefone. Nick. Que mais você quer aqui?
Ele tirou um papel do bolso.
— Achei isto sobre minha mesa no escritório. Você o deixou lá ontem, não?
— Sim, não sabia quando é que você ia voltar. Então quis que você o visse tão logo chegasse.
— Você quer discutir estas sugestões de mudança na empresa agora? Ou não?
— Bem, estarei lá segunda-feira às oito da manhã. . .
— Mas eu não. Se você quiser conversar, é agora, Moreninha, ou nunca.
Ele segurava o papel e olhava alternadamente para ela e para o fogo, como se estivesse ameaçando queimá-lo caso ela se negasse a discuti-lo naquele momento.
— Pode queimá-lo. Nick. Farei outra cópia. — Ele sorriu, desar­mado, e Prih então se animou. — Bem, vamos lá!
— Ótimo. Então você quer mudar o nome dos nossos produtos. Por que, Moreninha?
— Porque o consumidor gosta de experimentar produtos novos. E, mudando os nomes, poderíamos criar uma atmosfera de novidade em torno deles.
— Mas eu não gosto dos nomes que você sugeriu.
— Garanto que são melhores do que os atuais. E quanto ao sistema de propaganda? Já pensou em me autorizar a planejá-lo?
— Ainda não, Moreninha. A exposição teórica que você faz nessa folha é muito pouco. Quero fatos. Se você os conseguir, volte a falar comigo.
— Sim, senhor! — ela respondeu irônica, baixando a cabeça. Queria fazê-lo sentir-se um ditador.
Nick dobrou o papel, colocou-o no bolso e foi sentar-se ao lado de Prih, como quem não tivesse a menor intenção de ir embora.
— Você não foi convidado a ficar!
— É claro que fui! Alison me pediu que cuidasse de você e de Molly enquanto ela estivesse fora. Aliás, onde ela está?
— Dormindo. — E se lembrou do acontecimento do dia. — Hoje, pela manhã, ela ficou em pé sozinha, Nick!
— É mesmo? Mas ela é muito nova para isso! Essa garota! Posso acordá-la?
— Não, Nick. Que idéia!
— Bem, se não posso brincar com Molly, acharei outra coisa para fazer. — Ele percorreu com olhos lascivos o corpo dela.
Prih ficou vermelha. Depois tentou se recompor.
— Vá então ao quarto dela. Mas só para vê-la. Não a acorde. Por favor.
— Mudei de idéia. Prefiro ficar aqui olhando para você! — Mas fez em seguida uma expressão séria. — Seu pai e mamãe não sabiam que você pretendia ficar o tempo todo aqui na casa de Alison, Moreninha! Estão esperando-a para o jantar. Querem conversar conosco sobre a decisão que tomaram.
— Que decisão?
— Eles decidiram mudar para um apartamento. Estão cansados de ter que cuidar de uma casa tão grande como a nossa.
— Realmente, é uma boa idéia. E o que pretendem fazer com a casa?
— Talvez vendê-la.
Como se tivesse levado um choque, Prih deu um salto.
— Sem falar nada com o resto da família?
— Sem falar nada para você, Moreninha. Eu sabia disto há muito tempo. Mas por que você se incomoda? Não vai morar em Twin Rivers, mesmo.
— Eles deviam ter me contado!
— Eles não pensaram que isso lhe interessasse. Quanto a mim, eu tinha todo o direito de saber.
— Por quê?
— Porque eu teria que procurar uma nova casa.
— Então, para você, essa idéia que eles tiveram foi uma boa, não? Devia ser muito desagradável para você continuar com eles, não é mesmo?
— Nem tanto! Mas agora posso ir de vez para minha cabana, sem ter a impressão de estar abandonando-os.
— Ah, sim! Você agora vai viver entre as árvores e os animais. Sem dúvida, se dará muito bem!
— Você ainda não conhece minha cabana, não?
— Também nunca fui convidada.
— E provavelmente nunca vai ser. Mas ela é muito gostosa.
 Prih levantou-se, calada, e lhe serviu um chocolate quente. Depois, encheu novamente seu próprio copo, cobrindo-o com creme. Nick a observava, sem perder nenhum de seus movimentos. Nem se moveu para tomar o leite fumegante. De repente, o copo de Prih transbordou e o creme escorreu pelas bordas. Sem vacilar, ela esticou a língua, lambendo-o num gesto infantil.
Nick então se levantou, tirou-lhe o copo das mãos, colocou-o sobre a mesinha, e pegou-a pelos ombros, puxando-a para perto de si.
— Você não fez isso de propósito, fez?
— Fiz o quê?
— Essa lambida que deu no creme. . . Você não imagina a sen­sualidade desse seu gesto, não? Nem sabe o quanto me afeta, não é?
— Não. Se for assim, desculpe-me. Não há nada no mundo que eu queira menos do que excitar você. . .
Nick não deu mostras de ter ouvido. Prih, por sua vez, não conseguia mover-se um centímetro de onde se achava. Ele a olhava de um jeito irresistível e traçava o contorno de seus lábios com a ponta do dedo.
— Você me ouviu, Nick? — perguntou ela, com o último fôlego de que dispunha. — Não quero despertar nada em você. Inclusive porque não levaria a coisa alguma. Nunca vou sentir nada por você!
— Cuidado, Moreninha. Posso provar que você está enganada!
E, segurando-a, começou a beijá-la. Na boca, nos olhos, nas orelhas, no pescoço. Prih se debatia, mas ele a mantinha segura. Finalmente, ela conseguiu falar:
— É só você ficar perto de uma lareira que também pega fogo, hein? Solte-me, Nick!
Rindo da comparação, ele a tomou nos braços e atravessou a sala em direção ao quarto.
— Se o problema é esse, vamos sair de perto do fogo!
Ela se debatia e gritava, apavorada.
— Me ponha no chão, seu atrevido. Odeio você!
— Assim está bom? — gracejou, colocando-a sobre a cama.
Ficou ao lado dela alguns momentos, admirando aquela pele branca que o robe entreaberto deixava ver. Depois se jogou sobre ela e a beijava impetuosamente, enquanto percorria as mãos pelo seu corpo, dos pés à cabeça, enlouquecendo-a.
Prih sabia que tinha esperado por aquilo. Há muito desejava entregar-se à masculinidade de Nick. E suspirava de prazer quando lhe devolvia os beijos seguidos. Mesmo que ele a soltasse, ela sabia que não arredaria um palmo de onde estava. Seu corpo clamava por mais carinhos.
De repente, Nick empurrou-a para o lado e levantou-se com um sorriso irônico.
— Como experiência, foi um sucesso.
— O que você quer dizer com isso? — Prih estava decepcionada.
— Você disse que nunca sentiria nada por mim, lembra-se? Acho que acabou de ficar provado o contrário. Aliás, você não deveria se cobrir um pouco mais?
— Para quê? Você já viu tudo o que podia ser visto! — ela respondeu, magoada. Era muito duro ter que admitir que Nick a tinha usado simplesmente para mostrar que estava errada.
Nick tomou-lhe a mão em que estava o anel de noivado.
— Moreninha, se uma mulher está noiva de um homem e deseja outro, é bem melhor que ela desmanche tudo, não? Ou então ela não seria digna de jurar fidelidade diante de um altar — falou, devagar. Depois a olhou fixamente. E saiu do quarto.
Prih levantou-se rápido e seguiu-o até a sala. Ele já havia colocado o casaco e estava para sair. Ela se encostou à parede.
— Se quisesse você poderia ter feito amor comigo hoje — disse com a voz ainda trêmula.
— Sei disso!
Após um momento de silêncio ela perguntou:
— E por que não fez?
 Nick riu.
— A eterna pergunta... — E tornou-se subitamente sério. — Porque, querida, amanhã você poderia me acusar de tê-la forçado. Quando eu fizer amor com você, e, acredite em mim, vou fazer, será porque nós dois quisemos. E você não vai ter qualquer desculpa para depois negar que também queria.
Levantou-lhe a alça da camisola e beijou-a no ombro, despedin­do-se.
— Durma bem, Moreninha!
Um vento frio atingiu-a quando ele abriu a porta. Mas seu corpo continuava em brasa.
No meio da missa de domingo cedo, Molly resolveu chorar e queria de qualquer maneira descer dos braços de Prih. Sem alternativa, ela precisou levá-la para fora da igreja e ficar lá até que a cerimônia terminasse. Nick e Margaret a encontraram na saída da igreja. Ele, ao vê-la, sorriu com ar de satisfação, mas Prih o ignorou.
— Como está Brian? — perguntou para Margaret.
— Está se sentindo melhor esta manhã. Mas não quis vir à igreja. Disse que irá vê-la mais tarde, isso se você não quiser levar Molly para passar à tarde conosco.
— Oh, não! Ela está muito agitada. Acho melhor ela ficar em casa e repousar bastante. Pegar uma febre nesse inverno é perigoso.
— É verdade. A garota parece abatida. Talvez ela não tenha dor­mido tão bem quanto você esta noite! — ironizou Nick. Enquanto brincava com Molly.
— Realmente, dormi muito bem. . . — brincou ela.
— Você precisa descansar mais, Prih. Vai acabar ficando doente se não se cuidar! — aconselhou Margaret.
— Não se preocupe. Vou aproveitar para dar um cochilo quan­do colocar Molly para dormir. — E beijou Margaret. — Já vou. Tchau, querida. Diga a Brian que o espero à tarde.
— Pensei que você fosse dormir à tarde. . . Ou vai convidar Brian para dormir junto com você? — gracejou Nick. E olhou para os cabelos de Prih, que estavam soltos. . . — Gosto de seus cabelos quando estão nesse comprimento, Moreninha. Por que não os usa sempre assim?
Prih sentiu que as palavras de Nick, embora parecessem inocen­tes, eram provocadoras. Mas se controlou.
— Obrigada!
Ao tirar Molly dos braços de Nick, Prih quase causou uma cena. A garota agarrava-se à camisa dele, chorava, batia as perninhas. Na tentativa de segurá-la, as mãos de Nick tocaram as dela.
Por alguns segundos, ficaram paralisados, olhando-se como que hipnotizados. Mas Prih, readquirindo o controle, puxou a garota para seus braços e se afastou.
Em casa, Molly foi para a cama sem protestar. Prih, aprovei­tando à calma, resolveu assistir a um velho filme na televisão. Mas isto era insuficiente para manter sua mente ocupada. Durante a noite inteira, o que acontecera entre ela e Nick tinha tomado conta, sem descanso, de sua cabeça. Mesmo agora, a lembrança voltava forte, cruel.
O que estaria errado com ela? Seria uma promíscua por ter cor­respondido, sem conseguir reagir, aos carinhos de um homem de quem ela não gostava? E ainda mais ele sendo seu irmão adotivo? Estava noiva de Brian. Mas tinha gostado dos beijos de Nick! Ele poderia tê-la possuído sem que ela esboçasse qualquer protesto. Tinha que admitir: cada vez que Nick a tocava, toda moral deixava de existir.
Desligou a televisão e foi para o quarto de Alison. Sentou-se frente ao espelho e pôs-se a olhar a imagem refletida. Para si mesma, podia confessar a verdade: nem tudo em Nick a desagra­dava. Quando ele não estava por perto, ela sentia que até gostava dele. . . E desatou num riso triste.
Mais do que qualquer outra coisa, estava magoada porque Nick a abandonara na noite anterior. Provavelmente ele fora para o apar­tamento de Suzanne, e devia ter contado a ela a brincadeira. Como era humilhante se sentir usada!
E o que ele dissera sobre seus cabelos. . . Parecia que ela os tinha deixado soltos para agradá-lo. Como odiava aqueles cabelos! Sem refletir, pegou a tesoura que estava na gaveta da penteadeira e, como uma criança maldosa, começou a cortar. Grandes mechas caíam ao chão, mas ela persistia em seu trabalho insensato.
Só parou quando o telefone tocou. Aí, então, olhou-se no espe­lho como se estivesse vendo outra pessoa. E desatou num choro convulsivo. Era Margaret.
— Margaret, venha aqui, por favor — implorou desesperada. — Preciso muito de você. Agora.
— O que aconteceu querida? Molly está bem?
— Sim. Mas venha, Margaret. Não demore, por favor!
E desligou, chorando. Margaret chegou em um minuto, e Prih, ao abrir-lhe a porta, estava com a cabeça enrolada numa toalha.
— Qual o problema, Prih? Você se cortou?
Prih não disse nada. Apenas tirou a toalha da cabeça.
— Oh, meu Deus... Jenny, você ficou louca? — Margaret a olhava aturdida. — Por que você fez isso?
Prih deixou cair os braços e suspirou, já meio conformada.
— Bem, o estrago já está feito. Que podemos fazer agora?
— Só mesmo um profissional poderá ajudá-la, querida. Mas cal­ma. Conheço uma moça ótima em cortes. Ela vai dar um jeito.
Duas horas depois, Prih estava à frente do mesmo espelho, se olhando. Seus cabelos tinham sido cortados redondos, logo abaixo das orelhas.
— Vai levar algum tempo até você se acostumar, Prih. Mas acho até que ficou bem com os cabelos assim — consolou-a Mar­garet.
— Estou parecendo a Pequena Órfã. Nunca me senti tão mal!
— Você pode fazer uma permanente amanhã. Acho que lhe cai­ria muito bem. Depois, dentro de um ano, no máximo, estarão longos outra vez. E, quem sabe, talvez você até goste deles curtos. É mais fácil de cuidar!
Margaret sentou-se na cama e, olhando fixamente para Prih, pediu-lhe uma explicação para o que fizera.
O silêncio foi grande. Prih não sabia o que dizer. Finalmente, explodiu:
— Eu os cortei porque Nick gosta de cabelos longos.
Margaret começou a rir sem parar. Nisso, a campainha tocou e, antes que acordasse Molly, Prih correu para atender. Margaret a seguiu.
Antes de abrir a porta, Prih voltou-se para Margaret.
— E se você contar a Nick o que lhe disse, eu. . .
— Juro que não direi uma palavra! — Margaret pegou a bolsa e o casaco. — Mas eu gostaria de estar perto quando ele a visse. E, acredite ou não, eu teria feito a mesma coisa se estivesse em seu lugar.
— Vê-se que somos parecidas. — Prih suspirou já um pouco aliviada.
— E tenho um recado de Muriel para você. Você perguntou se ela gostou de Brian, não foi?
— Sim.
— Ela mandou dizer que não — falou Margaret e saiu pelos fundos.
Prih abriu a porta da frente e encarou Brian. Por alguns mo­mentos ele a olhou como se não pudesse acreditar no que via.
— Que loucura foi essa que você fez nos cabelos, Priscila?
— Nada. Assim ele fica mais fácil de cuidar. Margaret também achou uma boa idéia.
— Então ela também perdeu o juízo!
— Entre. Brian. Continuo a mesma pessoa, embora com os cabe­los curtos.
— Rosemary vai matá-la!
— Até nos vermos novamente, eles terão crescidos bastante. E você pode falar um pouco mais baixo? Não quero que Molly acorde.
— É sobre isso que vim falar com você, Priscila.
— Sobre o bebê?
— Não. Sobre Rosemary. Falei com ela hoje pela manhã e ela não admitiu a idéia de você ficar aqui durante todo o inverno.
— Ela vai admitir. Sempre acaba concordando comigo. E agora. Brian temos outras coisas muito importantes para conversar. — Prih tentava criar coragem para contar sobre Nick.
— O que quer falar comigo? — perguntou ele, como suspeitando de alguma coisa.
De repente, Prih desistiu de falar. Se ela contasse o que acon­tecera na noite anterior, ele certamente não acreditaria que nada de mais sério tinha ocorrido. E como poderia acusar Nick de tê-la forçado, se ela também o tinha desejado? Não, era melhor ficar calada. Teria menos problemas com a omissão do que com a verdade.
— Há coisas sobre as quais nunca conversamos. Precisamos falar delas antes do casamento. Sobre a decisão de ter filhos, por exemplo.
— Você quer um filho? Então, terá. Mas não logo.
— Como, Brian? Quer que esperemos até quando?
— Você tem vinte e dois anos. Esperar uns dez anos é perfei­tamente possível, não? E tem mais: eu preciso de você como anfi­triã, como contato nos clubes e nas reuniões sociais. E não poderá fazer nada disso se tiver uma criança para cuidar!
Prih ficou em silêncio por muito tempo. Por fim, perguntou:
— E o meu trabalho?
— Você terá que deixá-lo. Obviamente ele não é tão importante assim para você.
— Então não quer que eu continue trabalhando?
— Isso mesmo. Seria uma bobagem. Mas, se você quiser se manter ocupada, pode trabalhar nas horas vagas como relações pú­blicas da minha empresa.
— Mas não é a mesma coisa.
— Não vejo problema algum nisso. Olhe, não vou precisar que você ajude nas despesas da casa; além do mais, Rosemary vai lhe dar toda a sua herança quando casarmos. Ela sabe que teremos muitos gastos extras.
— Ter marido é um luxo muito caro, não, Brian?
— Você vai viver muito melhor que agora, Priscila! Não vai nunca mais precisar dividir um apartamento com outras três pessoas.
— Ah, sei! E quanto a meu pai? Vou poder visitá-lo de vez em quando? Ou vou ter que lhe dizer adeus quando for embora?
— Rosemary não iria se incomodar por você o visitar. Tenho certeza.
Prih ponderou bem as palavras de Brian.
— Então, tudo o que Rosemary quer ou pensa é importante para você, não? E quanto ao que eu penso?
— Bem, ela é sua mãe antes de tudo. Você deve sempre falar com ela antes de tomar qualquer decisão.
— E há mais alguma coisa que Rosemary queira? — perguntou Prih, tentando dar um tom natural à voz.
— Fico contente que tenha entendido Priscila! Ela acha que seria uma boa idéia nós nos casarmos em julho. Mas bem agora você tinha que cortar seus lindos cabelos...
— Deixe meus cabelos fora disso, Brian. E concentre-se em Rosemary. — Prih sentou-se da maneira como a mãe lhe ensinara: como uma dama! — E se ela não quiser que nos casemos em julho?
— Então teremos que esperar.
— E se não esperarmos? E se quisermos morar em outra cidade? Como ela receberia essa decisão?
Brian hesitou por alguns momentos.
— Nem pense em contrariá-la, Priscila. Ela poderia tirá-la do testamento. . .
— Hum... E se Rosemary me deserdar, qual seria o problema, Brian? Afinal, você quer se casar comigo, Priscila Stanford, ou com a herdeira de Rosemary?
— Você está ficando louca, Priscila! Que custa fazer a vontade de alguém que se preocupa tanto com o seu futuro?
— Não custa nada, Brian. Só que não acredito que ela vá me dar a herança após o casamento. Desde que me formei, tenho me mantido sozinha, você sabe. Ela nunca me ajudou em nada.
— Mas pode confiar no que lhe digo Priscila! Além disso, ela me prometeu que vai fazer para você a maior festa de casamento que uma moça já sonhou. Inclusive seu vestido vai custar uma fortuna. . .
— Você não percebe Brian? Eu não quero que mamãe escolha meu vestido. Não quero que ela escolha nada para mim. Principal­mente meu marido.
E, tirando o anel de noivado do dedo, entregou-o a ele.
— Acredito que ela escolheu isso também! Devolva-o a ela, então. Porque eu, como Priscila Stanford, não lhe interesso. Estou cansada de ouvi-la dizer que vai me deserdar, e não quero como marido um homem que fique a meu lado só pensando em agradá-la.
— Priscila. . .
— Não tente me fazer mudar de idéia, Brian! Iria perder seu tempo. Boa sorte em sua próxima caçada à fortuna.
Prih levantou-se e foi ao quarto de Molly, que estava acordando. Não viu quando Brian saiu da casa.
As palavras de Nick martelavam em sua cabeça enquanto ela trocava as fraldas da menina. Será que ele tinha razão?
"Oh, pare com isso, Prih!", ela se censurou. "O que Nick disse ontem à noite não tem nada a ver com essa reação de agora."
As lágrimas que lhe escorriam pelo rosto eram quentes, pesadas. Mas eram lágrimas que a limpavam por dentro, que lhe devolviam a liberdade.

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